quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Extinto ou não extinto?

por Gustavo Miranda

Luto pela extinção de Neofelis nebulosa.
Fonte: Direito de Viver.
Há uma imagem circulando pela Internet que mostra o deslumbrante felino Neofelis nebulosa com uma declaração de luto devido à extinção da espécie. Essa notícia saiu na mídia em maio deste ano, mas só tive conhecimento recentemente. Dei uma procurada e descobri alguns detalhes que gostaria de expor aqui, pois na verdade, a espécie não está extinta.

Como todo grande felino, o leopardo-nebuloso tem uma ampla distribuição. Ele ocorre no Sudeste Asiático e no Himalaia (sul da China, Butão, Nepal, nordeste da Índia, Myanmar, Tailândia, Vietnam, Malásia, Camboja, Laos e Bangladesh).

Área de distribuição de Neofelis nebulosa. Fonte: WWF.
Há alguns anos especialistas em felinos analisaram populações de Neofelis nebulosa de diferentes localidades e consideraram que algumas das aglomerações do leopardo-nebuloso apresentavam diferenças morfológicas. Com isso, eles dividiram a espécie amplamente distribuída em três subespécies: N. nebulosa nebulosa, N. nebulosa brachyurus e N. nebulosa macrosceloides (uma quarta subespécie, N. nebulosa diardi, é atualmente considerada como uma espécie diferente (Neofelis diardi), como foi originalmente proposto por Cuvier (1823)).

A “espécie” extinta à qual a imagem que está circulando na Internet se refere é, na verdade, à subespécie N. nebulosa brachycephalus, que ocorre em Taiwan. Há biólogos que consideram que o nível taxonômico subespécie não existe, isso é, eles levam em conta somente a classificação até o nível de espécie. Se isso for considerado, pode-se dizer que "apenas" a população que ocorria em Taiwan foi extinta e não a espécie como um todo.

Independente do nível taxonômico, a extinção é lamentável e digna de pesar. O que está acontecendo com a Neofelis nebulosa (a fragmentação e destruição do seu habitat) é uma lástima e deve ser cessado imediatamente.  

Acredito que a mensagem na imagem tenha sido escrita com a intenção de impactar para chamar atenção e denunciar os terríveis impactos ambientais que o homem está causando ao meio ambiente. Contudo, é sempre bom levar em conta os detalhes para não obter e passar informações mutiladas.

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

Pensamentos e pensadores

"Algumas medidas são cruciais para nossa compreensão do universo. Qual é, por exemplo, o diâmetro médio da Terra? É 12,742 quilômetros. Quantas estrelas existem na Via Láctea? Aproximadamente 10^11. Quantos genes existem num vírus? São 10 (no fago φX174). Qual a massa de um elétron? É de 9,1x10^-28 gramas. E quantas espécies de organismos existem na Terra? Nós não sabemos, nem mesmo na mais aproximada ordem de grandeza."

E.O. Wilson [1][2][3], 1985, p. 21.



p.s.: apesar de relativamente antiga, a afirmação de Wilson não deixou de ser atual; contudo, dispomos de uma estimativa recente da diversidade na Terra: Mora et al, 2011. How many species are there on Earth and on the Ocean? Plos Biology, 9(8).

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Mais uma espécie de Homo?

Análise comparativa 3D confirma o status de Homo floresiensis como uma espécie fóssil de Homo.

por Gustavo Miranda

Crânio de Homo floresiensis. Imagem: Brown et al., 2004.
Em 2003 foi descoberto um pequeno crânio de hominídeo na Ilha de Flores, Indonésia, que foi atribuído e uma nova espécie chamada Homo floresiensis. Esta espécie foi proposta como originária de uma população anã de Homo erectus.

Após a descoberta, H. floresiensis teve sua validade coloca em xeque quando estudos mostraram que possivelmente o pequeno tamanho poderia ser atribuído a diversas condições patológicas que resultariam em baixa estatura, como hipotireoidismo congênito, síndrome de Laron e microcefalia. Um trabalho recente, contudo, aplicou técnicas de morfometria geométrica 3D para comparar a forma do crânio do espécime de Homo floresiensis com outros fósseis humanos, assim como com crânios modernos que sofreram de microcefalia ou outras doenças.

O estudo encontrou evidências de que Homo floresiensis e espécies humanas extintas são mais proximamente relacionados entre si do que com humanos modernos com patologia. Com isso, foi refutada a hipótese de que esse espécime representa um humano moderno com condição patológica, suportando a existência da espécie H. floresiensis.

Referências
Brown P, Sutikna T, Morwood MJ, Soejono RP, Jatmiko, Saptomo EW & Due RA (2004). A new small-bodied hominin from Late Pleistocene of Flores, Indonesia. Nature 431: 1055-1061. Acesse aqui (trabalho de descrição de Homo floresiensis; se não tiver acesso, baixe aqui).
Baab KL, McNulty KP, Harvati K (2013).  Homo floresiensis Contextualized: A Geometric Morphometric Comparative Analysis of Fossil and Pathological Human Samples. PLoS ONE, 8(7): e69119. Acesse aqui (trabalho de morfometria geométrica 3D do crânio de H. floresiensis; acesso grátis).

quarta-feira, 3 de julho de 2013

Boa Vista, péssima audição

Por Gustavo Miranda

Museu Nacional do Rio de Janeiro, Quinta da Boa Vista.
Poucas cidades brasileiras possuem lugares que fornecem à população contato direto com a natureza. O Rio de Janeiro é uma cidade privilegiada nesse sentido. Ela abriga uma das maiores áreas verde urbanas do mundo, a Floresta da Tijuca, assim como diversos outros lugares, como o Jardim Botânico, o Bosque da Barra, o Parque do Flamengo, o Parque Henrique Lage, o Parque Municipal do Mendanha, a Quinta da Boa Vista, além das praias do litoral carioca (são mais de 40, nem todas próprias para banho). Esses lugares são refúgios do dia-a-dia, momentos de fuga do estresse e da correria da vida cotidiana.

É muito bom estar no Rio de Janeiro e poder desfrutar de todas essas belezas naturais. Em particular, me sinto privilegiado por frequentar um lugar tão bonito e com uma história tão importante para o país como a Quinta da Boa Vista. Além do Zoológico e do Museu Nacional, o parque possui campos abertos, lagos, árvores e aves (além de muitos pivetes; se for passear por lá, cuidado!). Durante os finais de semana e feriados, muitas famílias se reúnem nessa área em São Cristóvão para um momento de descontração, para instantes de contato com a natureza em meio à selva de pedras. 

Devido a grande quantidade de árvores e de alimentos disponíveis, as aves são encontradas em grande abundância na Quinta da Boa Vista. Estima-se que essa área possua uma das maiores quantidades de espécies de aves livres do Rio de Janeiro. Contudo, é uma pena que nem todas as pessoas que lá frequentam se sintam à vontade. 

Outro dia estava entrando na Quinta e muitas aves estavam cantando e voando de uma árvore para outra; uma cena bonita de ser ver e ouvir. Um grupo de pessoas sentadas num dos gramados curtindo a manhã também reparou no grupo comentou: "Nossa, que barulho mais chato. Manda esses passarinhos calarem o bico, gritam alto pra caramba...".

Não sei se é por causa da minha cabeça de biólogo, mas fiquei indignado com o comentário. Quem em um parque cercado de aves se incomoda como o canto dos psitacídeos? Quer dizer que ouvir funk, samba, pagode ou qualquer outro ritmo musical a toda altura dá pra aturar, mas o cantarolar dos Psittaciformes incomoda o ouvidinho das moçoilas?

COMO E POR QUE AS AVES CANTAM?

Reconstrução em 3D de siringe.
Os sons das aves são produzidos pela siringe, uma estrutura formada por músculos e cartilagem localizada na traqueia. Ela tem a mesma função que as cordas vocais nos humanos, a vocalização.

Os Psittaciformes (araras, maritacas, papagaios entre outros) possuem um amplo repertório de cantos, muito dos quais não se conhece a função. Estudos indicam que existem cantos de voo, de contato, de alarme, de sentinela, de aviso sobre a disponibilidade de alimentos, de demarcação de território, de atração de parceiras dentre outros. 

As pessoas que reclamam do cantarolar dos bichos não imaginam o quanto eles (esses sim) são afetados pelos barulhos da cidade. Isso porque para combater o excesso de ruído, as aves tendem a aumentar a intensidade do canto ou adotar frequências mais agudas, já que o barulho urbano tem um espectro mais grave. Logo, com os ruídos elevados, as aves podem ser severamente prejudicadas, e as modificações no canto não são suficientes para manter a comunicação. Calcula-se que pode haver uma redução de 1500% na distância de comunicação de algumas espécies (veja aqui e aqui)!

Infelizmente não há leis no Brasil que protejam as aves desse tipo de interferência, ao contrário do que ocorre na Europa, por exemplo. Em alguns países europeus, barreiras acústicas são colocadas em rodovias ou avenidas que cortam ou passam ao lado de áreas habitadas ou onde há fauna representativa de aves. Com isso, o som dos veículos é refletido e retorna ao ponto da emissão, sem afetar muito o ambiente.

POR QUE FAZEMOS TANTO BARULHO?

Não temos capacidade natural de produzir diferentes tipos de sons como as aves. Nossas cordas vocais são limitadas à capacidade de produzir um espectro pequeno de volume e de tipos de ruídos. Por outro lado, inventamos MUITOS aparatos para fazer e/ou que fazem barulho. Carros, motos, ônibus, britadeiras, furadeiras, música alta... Pra se ter uma ideia, atualmente a poluição sonora é maior que a poluição da água; ela está em segundo lugar no ranking de poluições causadoras de doenças (atrás apenas da poluição do ar; dados da Organização Mundial de Saúde, OMS). Os otorrinolaringologistas recomendam que não se ouça sons por tempo prolongado acima de 80 decibéis (db) (que é em torno de metade da capacidade máxima de mp3, mp4, ipods, celulares, etc) caso contrário as células responsáveis por levar a informação sonora para o nervo auditivo (que vai transportar a informação para o cérebro) começam a se degradar levando a surdez. Em áreas residenciais o valor máximo recomendado pela OMS é de 50 db. Contudo, buzina de moto, barulho de caminhão, avião, britadeira e até os sons da feira passam dos 100 db (confira aqui).

Outro mal da humanidade são os carros que se acham trios elétricos. Há tempos isso virou moda, e muitos “machões” equipam seus carros com enormes alto falantes e deixam o volume no máximo para todos ouvirem sua (nunca) agradável música. Pra vocês que fazem isso, rapazes, aí vai um dado. Pesquisas recentes indicam que o volume da música que se coloca no carro é equivalente ao volume preenchido nas cuecas. Então fiquem atentos, pois as boates ambulantes que produzem podem estar denunciando ao invés de promovendo vocês...

Muita gente não sabe, mas existem leis que regulamentam a quantidade máxima de som permitida (aqui no Rio é esta). Infelizmente quase ninguém respeita essa lei. Quando nos sentimos incomodados e ligamos para a polícia para fazer uma denúncia, simplesmente nada é feito (experiência própria). Além de nenhum interesse dos policiais (que muitas vezes são comprados com algumas garrafas de cerveja [também experiência própria, já vi isso acontecer]), os policiais não contam com um decibelímetro para verificar a altura do som emitido (aí já é querer muito...).

Enfim, a tecnologia avançou e pouca foi a preocupação em se evitar ruídos excessivos dos equipamentos que utilizamos. Não há preocupação nem mesmo com nosso bem estar, quanto mais com os outros animais que nos cercam. Há o total desprezo, e esse desprezo leva a ignorância e a ignorância leva a completa falta de admiração com o bem mais precioso que possuímos que é nossa biodiversidade e suas nuances.

ALGUMAS AVES DA QUINTA DA BOA VISTA

Fonte das fotos e mais informações sobre as aves nos links:

Agradecimento
Gabriela Frickes - Setor Ornitologia, Museu Nacional do Rio de Janeiro/UFRJ

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Pensamentos e pensadores

"Vejo a natureza como uma estrutura magnífica que podemos compreender apenas imperfeitamente e que deveria inspirar em qualquer pessoa com capacidade de reflexão um sentimento de humildade"

Albert Einstein, físico (1879-1955).

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